terça-feira, 26 de agosto de 2008

Acordar, viver
Como acordar sem sofrimento?
Recomeçar sem horror?
O sono transportou-me
àquele reino onde não existe vida
e eu quedo inerte sem paixão.
Como repetir, dia seguinte após dia seguinte,
a fábula inconclusa,
suportar a semelhança das coisas ásperas
de amanhã com as coisas ásperas de hoje?
Como proteger-me das feridas
que rasga em mim o acontecimento,
qualquer acontecimento
que lembra a Terra e sua púrpura
demente?
E mais aquela ferida que me inflijo
a cada hora, algoz
do inocente que não sou?
Ninguém responde, a vida é pétrea.
Generaciones y semblanzas (João Cabral de Melo Neto)
Há gente para quem
tanto faz dentro e fora
e por isso procura
viver fora de portas.
Há gente que se aquece
por dentro, e há em troca
pessoas que preferem
aquecer-se por fora.
Há gente que se gasta
de dentro para fora,
e há gente que prefere
gastar-se no que choca.
Há gente que se infiltra
dentro de outra,
e aí mora,v
ivendo do que filtra,
sem voltar para fora.